Saí do escritório quase de noite, debaixo de chuva e com pressa, porque sabia que o avião não esperava por mim.
Deixei tudo para trás: a mala, a roupa, os documentos... apenas levei comigo, dentro do passaporte, uma fotografia de família, indício da minha identidade.
Corri desalmadamente descendo aquela rua escura e escorregadia, que durante anos foi o meu cenário de trabalho.
Espavorido, cheguei mesmo a tempo de embarcar.
Um pensamento ribombava na minha cabeça: é hoje!
Sentei-me no meu lugar, ainda igual a tantos outros passageiros, e deixei-me levar.
Com a ideia de mudança, senti um nervoso na ponta dos dedos.
Tremia, mas com o descolar do avião ninguém notava.
Tranquilizei-me só quando já voava entre as nuvens. Nessa altura, tive a garantia de estar entregue à sensibilidade de profissionais atentos. Descansei.
Durante a viagem, fizemos várias escalas. Saboreei cada uma como ingrediente essencial ao entusiasmo da chegada. Em cada aeroporto, engrandeci a vontade de mudar, o desejo de me afirmar.
Vislumbrei as provas de que posso chegar aonde quero ir.
Quando aterrámos, suspirei em voz alta uma certeza:
Estou no sitio certo. Agora, eu sou eu.